Estado da Direita
Estamos a menos de um mês das
eleições legislativas de outubro, mas há muito que nuvens negras pairam sobre o
espectro da direita em Portugal. Na verdade o sol nunca brilhou forte para direita portuguesa, por culpa
própria e por culpa alheia. Por um lado não se afirmou e por outro a elite política e cultural dominante
obliterou-a.
A direita chega a ter vergonha
de si mesma, apelidando-se frequentemente de centro-direita para não ferir as
suscetibilidades daqueles que a limitam e aprisionam aos fantasmas do fascismo
e do capitalismo selvagem.
Importa entender que existem
vários tipos de direita com características diferentes consoante o período
histórico e a geografia em questão (e.g. para um europeu continental, um
britânico, ou um norte-americano, o conservadorismo e liberalismo têm
significados diferentes). A direita, tal como a esquerda, compreende uma grande
pluralidade de famílias, que abrange liberais, conservadores, democratas
cristãos, fascistas, nacionalistas e muitas outras sub famílias como o
nacional sindicalismo, o libertarismo, entre outras.
Em Portugal, o liberalismo (na
sua forma mais clássica) vislumbra-se em franjas do PSD e CDS, mas também do
PS. Mais recentemente surgiu a Iniciativa Liberal, que certamente terá um duro
caminho pela frente num país que sempre se sentiu aconchegado por um Estado
omnipresente, à semelhança de praticamente toda a Europa continental. Assim foi
na Monarquia, no Estado Novo e também no Pós 25 de Abril.
Apesar do eleitorado
conservador de direita votar tipicamente no PSD, CDS e Aliança, o
conservadorismo em Portugal é também um fenómeno de esquerda. O partido de
poder mais conservador e que agita a bandeira do patriotismo é, nem mais nem
menos, um partido de esquerda – o histórico PCP. Trata-se de um caso único nas
democracias ocidentais.
A direita nacionalista e
identitária é essencialmente representada pelo PNR e pelo Chega! de André
Ventura. Tratam-se de partidos de dimensão reduzida contextualizados num país
onde os temas da insegurança, associados à perda de identidade e pressão
migratória proveniente de África e Médio Oriente, não entram no debate
político. O contraste é grande quando comparados com os seus congéneres
europeus, que se agigantaram nos parlamentos nacionais e que recentemente
fizeram e fazem parte de soluções governativas em países como Itália, Áustria
ou nas nações do grupo de Visegrado.
Como observado nas últimas
eleições europeias, a ecologia conquistou um lugar cimeiro no debate político,
sendo que os partidos verdes europeus conquistaram poder e influência nos
vários Estados-Membros da UE. Portugal não foi exceção. O aquecimento global
tomou o lugar de principal ameaça à vida na Terra e os partidos à direita foram
os últimos a assumir o problema e a perceber de que se trata de um tema
decisivo para o eleitorado, especialmente o mais jovem e urbano que marcará a
agenda política nas próximas décadas.
Ao contrário do que se possa
pensar, a ecologia não é e nunca foi uma bandeira exclusiva de partidos de
esquerda. Por todo o mundo existem partidos ecológicos conservadores como o
português MPT—Partido da Terra. Atualmente André Silva é o ponta de lança
político da ecologia em Portugal, mas importa não esquecer o papel fundamental
para a preservação do meio-ambiente de figuras da direita e centro-direita em
Portugal como foram Gonçalo Ribeiro Telles e Carlos Pimenta.
A grande incógnita relativamente
ao resultado das eleições de 6 de outubro, é saber se o PS precisará de um
parceiro para governar nos próximos quatro anos. Todos os cenários estão em
aberto, inclusive uma solução governativa improvável que inclua o PSD (um
desfecho pouco interessante para António Costa). A realidade faz antever uma
travessia no deserto para a direita, considerando uma transferência de votos do
PSD para o PS, no que toca ao eleitorado centrista; e uma transferência de
votos para os pequenos partidos à direita dos sociais democratas, por parte do
eleitorado de direita/centro-direita. A direita em Portugal ficará assim
polarizada, aguardando novos líderes e novos projetos.
David
Pimenta
(artigo também publicado em: https://www.publico.pt/2019/09/17/opiniao/opiniao/estado-direita-1886920)

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