O PSD de Rio e o amanhã
Na apresentação da sua recandidatura a líder do PSD, Rui Rio surgiu tenso e acossado, preparado para a guerra. Rio apelou, mais uma vez, à união do PSD em torno da sua liderança, mas o seu tom e postura não tinham nada de agregador; Rio apresentou sobretudo uma grande vontade em esmagar a oposição interna, algo raramente visto em relação à oposição externa do PS que, antes da não aprovação do orçamento de Estado, sempre foi tratada com uma docilidade institucional explicada por um alegado respeito à estabilidade (ou estagnação, segundo algumas opiniões) do país.
Considerando o PS contemporâneo um catch all party,
ideologicamente social-democrata, que capta votos ao centro e à esquerda, qual
a identidade do atual PSD? O atual PSD é parte do que o PS é e não é muito mais
– esse é o problema que Rio não tem conseguido resolver, por erros de comunicação
e de ideologia. Rio esforça-se, vezes sem conta, por comunicar um PSD de centro
e centro-esquerda ignorando que uma parte substancial do eleitorado português, tal
como o eleitorado de qualquer país europeu, vota no grande espaço de
centro-direita e direita. É nesse sentido que se verifica o óbvio crescimento
de partidos como o Chega e a Iniciativa Liberal, à semelhança de partidos
congéneres europeus que são eleitoralmente bem-sucedidos há décadas.
O PSD nem sempre foi assim. Nascido num berço
social-democrata de centro-esquerda, o partido poderia ter seguido a fórmula
pristina da social-democracia (i.e., a transição do capitalismo para o
socialismo através de processos políticos não revolucionários), mas foi
mudando, influenciado pelas grandes transformações políticas, económicas e
sociais de Portugal e do Mundo, sobretudo a integração europeia e a queda da
União Soviética. Entre o 25 de Abril e atualidade, diferentes elites do espaço
de centro-direita e direita dominaram o PSD, desde liberais, conservadores,
neoconservadores, democratas cristãos e até populistas de direita; e parte dessas
elites ganhou presença no quadro de honra da história do PSD, nomeadamente na organização
e liderança de governos de centro-direita, como foram os casos da AD, dos
governos de Cavaco Silva e da coligação “Portugal à Frente” liderada por Pedro
Passos Coelho.
Ainda não é certo sobre quando é que Rui Rio sairá de cena,
mas o próximo líder do PSD terá de abordar forçosamente dois grupos de
eleitores: parte da direita que, no passado, apoiou soluções políticas
federativas do espaço do centro-direita liderado pelo PSD; e os abstencionistas,
que constituem uma franja heterogénea da população, onde se encontram inúmeros
cidadãos que não votam pelo facto de não vislumbrarem soluções políticas realmente
alternativas e que olham para o atual PSD como um partido indiferenciado do PS.
O PSD atual tem apresentado patologias que se anteveem fatais
para Rio: é paradoxal quando pretende ser alternativa ao governo socialista,
mas não atua como tal; é esquizofrénico na sua rejeição de um posicionamento de
direita e, simultaneamente, abre a porta a coligações com partidos
assumidamente de direita; e é desagregador pelo facto de não representar
ideologicamente uma porção substancial dos seus militantes e de não defender os
interesses de parte do seu eleitorado de centro-direita e direita.
As nuvens que ameaçam a recuperação económica mundial do
mundo pós-confinamento estão cada vez mais negras para países altamente
endividados como Portugal. A atual crise energética, acompanhada por uma
inflação cada vez mais intolerável, tem estimulado os portugueses a pedirem um
novo paradigma fiscal. Mas as preocupações não ficam por aqui, temas
estruturantes como a reforma do Estado, o inverno demográfico português, ou o
posicionamento geopolítico e geoeconómico de Portugal carecem de estratégia e
operacionalização. Neste contexto, é esperado que o PSD de amanhã abra o seu
horizonte ideológico ao centro-direita e direita, tornando-se numa verdadeira
alternativa ao espaço político socialista.
David Pimenta (Artigo também publicado em:
https://www.publico.pt/2021/10/30/opiniao/opiniao/psd-rio-amanha-1983108)
Comentários
Enviar um comentário